sábado, 29 de novembro de 2008

Aviso - Lya Luft

Resolvi comprar e ler um livro de poemas da Lya Luft. Além de ser uma ótima articulista e contista, pude constatar também a sua habilidade como poetisa. Gostei muito desse poema que se encontra no livro "Para não dizer adeus", acredito que passa uma mensagem real, espero que gostem também.

Se me quiseres amar, 
terá de ser agora: depois
estarei cansada.
Minha vida foi feita de parceria com a morte:
Pertenço um pouco a cada uma,
pra mim sobrou quase nada.

Ponho a máscara do dia, 
um rosto cômodo e simples,
e assim garanto a minha sobrevida.

Se me quiseres amar,
terá de ser hoje:
amanhã estarei mudada.
sexta-feira, 28 de novembro de 2008

William Shakespeare

Um soneto de um dos mestres da poesia.


De almas sinceras a união sincera 
Nada há que impeça: amor não é amor 
Se quando encontra obstáculos se altera, 
Ou se vacila ao mínimo temor. 

Amor é um marco eterno, dominante, 
Que encara a tempestade com bravura; 
É astro que norteia a vela errante, 
Cujo valor se ignora, lá na altura. 

Amor não teme o tempo, muito embora 
Seu alfange não poupe a mocidade; 
Amor não se transforma de hora em hora, 

Antes se afirma para a eternidade. 
Se isso é falso, e que é falso alguém provou, 
Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou. 

domingo, 23 de novembro de 2008

A Hora da Estrela - Clarice Lispector

De vez em quando, pego-me lendo Clarice Lispector. Talvez por lazer, por cultura, por curiosidade...
Eis que li A Hora da estrela! Surpreendi-me. Um livro com uma sensibilidade tamanha, que nos faz refletir sobre o que é a felicidade, o que é o existir em nós mesmos. Selecionei, dentre as inúmeras e maravilhosas citações do livro, algumas que me tocaram com mais força. Reflitamos, vale a pena!


“Eu não sou um intelectual, escrevo com o corpo. E o que escrevo é uma névoa úmida. As palavras são sons transfundidos de sombras que se entrecruzam desiguais, estalactites, renda, música, transfigurada de órgão. Mal ouso clamar palavras a essa rede vibrante e rica, mórbida e escura tendo como contratom o baixo grosso da dor. Alegro com brio. Tentarei tirar ouro do carvão. Sei que estou adiando a história e que brinco de bola sem a bola. O fato é um ato? Juro que este livro é feito sem palavras. É uma fotografia muda. Este livro é um silêncio. Este livro é uma pergunta”.

“Assim como ninguém lhe ensinaria um dia a morrer: na certa morreria um dia como se antes estivesse estudado de cor a representação do papel de estrela. Pois na hora da morte a pessoa se torna brilhante estrela de cinema, é o instante de glória de cada um e é quando como no canto coral se ouvem agudos sibilantes.” 

"Ela acreditava em anjo e, porque acreditava, eles existiam."

" - Eu vou ter tanta saudade de mim quando morrer."

"[...] o tudo é um oco nada"

"Se ainda escrevo é porque nada mais tenho a fazer no mundo enquanto espero a morte"

"O pecado me atrai, o que é proibido me fascina."

"Mas quem sabe se ela não estaria precisando de morrer?"

"Eu, que simbolicamente morro várias vezes só parta experimentar a ressurreição."

"A vida é um soco no estômago"

"Então - ali deitada - teve uma úmida felicidade suprema, pois ela nascera para o abraço da morte. A morte que é nesta história o meu personagem predileto."


domingo, 16 de novembro de 2008

A Caverna - José Saramago

Há algum tempo, ainda nesse ano de 2008, li "A Caverna" de José Saramago, escusado seria elogiá-la, e retirei algumas citações interessantes do livro. Espero que gostem. Les voilà

"[...] porque só com esse saber invisível dos dedos se poderá alguma vez pintar a infinita tela dos sonhos.” 

 “[...] a melhor maneira de fazer morrer uma rosa é abri-la à força quando ainda não passa de uma pequena promessa em botão.”  

“[...] Na vida tudo são fardas, o corpo só é civil verdadeiramente quando está despido [...]” 

"Nem a juventude sabe o que pode, nem a velhice pode o que sabe"

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Escreva com fé

Marco Hruschka

Um sentimento nasce com a escrita.

Lápis na mão é apenas instrumento,

Imortalizarei meu pensamento

Na linguagem do povo ou na erudita.

 

Quando escrevo, o espírito medita,

Posso ver o sagrado firmamento,

Da cabeça aos pés sinto-me um talento

E o fraco coração forte palpita.

 

Então caro escritor vá sempre em frente,

Abuse do teu cérebro indo além:

Escreva realmente o que se sente.

 

Passe pro papel tudo que convém,

Porém, seja um docente consciente,

Crie, e esqueça dádivas de outrem.


"Não, não é fácil escrever. É duro como quebrar rochas." Clarice Lispector (A hora da estrela)

"Dificílimo acto é do de escrever, responsabilidade das maiores..." José Saramago (A Jangada de pedra)

domingo, 9 de novembro de 2008

Vivificação do Homem


Marco Hruschka


Comemora-se hoje o Natal,

Dia em que despertou o Salvador:

Espírito bondoso, Redentor

Que na cruz padeceu sem nem um mal.

 

Sua presença é firmamental,

Ao seu lado ninguém sente mais dor,

Consigo é paraíso, tudo alvor,

Deus Homem é paz na alma celestial

 

A esperança agora é crescente,

O âmago a sobejar jubilação,

Reverência ao máximo docente.

 

Oxalá vida mansa, gozação!

Acuda a bendição do Supremo Ente,

Presentear-nos-á com pia unção.


OBS: Soneto publicado pela CBJE no dia 30 de novembro de 2008 no livro "Os mais belos textos de Natal - Edição 2008".

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Ao anjo o que é do Anjo


Marco Hruschka
Açodadamente, abri os olhos e tudo o que vi foram tecidos brancos remexendo-se com o vento e uma cortina cor de paraíso, digo paraíso porque a mistura de cores as quais eu visualizava representava, a meu ver, o próprio firmamento. O sol contribuía com um tom alaranjado, um tanto esmaecido pelo branco da cortina, o céu, azulado e limpo, transparecia uma cor a qual não sei definir bem se é o azul celeste ou um cinza pálido que a fazenda à janela, teimosa, insistia em amenizar os tons. E, para a minha sorte, estávamos vivendo a primavera, flores arco-íris nas árvores ajudavam a completar o quadro utópico. Coloração suave e meiga capaz de acalmar o coração dos mais aflitos. Eu realmente achava estar no céu, uma paisagem perfeita à minha frente, porém, mais tarde, descobri que os campos divinos resplandeciam muito mais do que aquela mera harmonia colorida.
O dia realmente estava belo, mas, talvez, muito mais do que o normal porque na noite anterior eu havia encontrado, passando pela Ponte Nova, uma jovem boneca de porcelana, uma beldade sem definições, um anjo sem asas perdido cá na terra. Claro está, foi amor à primeira vista. Queria saber o seu nome a qualquer custo e, quando a avistei saindo da loja de doces, corri até lá para perguntar ao vendedor o seu nome, rezando para que ele o soubesse. E ele sabia, graças! Chamava-se Angélica. Confesso: nunca soube de um nome com tanta coerência, um nome tão correto para uma pessoa tão... perfeita, é a palavra propícia, perfeita!
Fiquei tão feliz com a descoberta que até dei uma gorjeta ao pobre moço da loja. Tenho esse defeito, sou muito idealizador, afinal, estou tão feliz e ela nem sabe que existo. Que dor no coração! Ela é o meu sonho de todas as madrugadas, é a água que bebo, o ar para meus pulmões, o sangue para minhas veias. Preciso-lhe, suplico-a, possuí-la-ei? Desejo imaculado!
Os dias se passaram e saber o seu nome não era o suficiente, minha alma pedia mais, minha mente não a esquecia, e meu corpo latejava por ela. Fui até a doçaria e fiz amizade com aquele rapaz, chamava-se Emanuel. Tinha lá os seus vinte e oito anos, era casado e tinha um filho; tinha a pele escura, estatura mediana e era boa pessoa. Consegui com ele o endereço de minha amada, depois de muita insistência e persuasão, pois o jovem tinha um caráter admirável. Ela era cliente, há três anos, da doçaria, por esse motivo seu endereço constava cadastrado na loja. Bendito dia, agora poderei vê-la novamente!
Sinto não ter sido totalmente honesto com vocês. Não lhes contei que sou um tanto quanto tímido, por isso não tive êxito quando fui procurá-la logo no outro dia. Ela saía de casa e eu pensava em abordá-la de alguma forma, mas minhas pernas tremiam de vergonha. Resolvi exercer outra tática para fazê-la saber que eu existo, e, quem sabe, através de um milagre, conquistá-la.
Devem estar curiosos para saber como é essa doçura de pessoa, a Angélica. Devo descrevê-la para dar mais verossimilhança aos meus relatos, e para que me creiam deveras. Comecemos pelos cabelos, que são cachos de ouro, ondulados pela própria mão divina, a pele, puro leite, a boca, rosada e arredondada, o rosto com traços finos e suaves, o colo, sempre à mostra, realmente convidativo; era magra, porém, possuía curvas as quais não sei descrever, seu andar acentuava seu quadril, um pouco mais largo do que a cintura. Creiam-me, é um anjo!
Estou tão perdido com essa situação toda que até esqueci de apresentar-me. Muito prazer, chamo-me Paulo, Paulo Quimera. Tenho vinte e cinco anos de idade, um rapazola, como diria a minha finada avó. Sou escritor, porém desacreditado.  Infeliz e casmurro, passo dias escrevendo e escrevendo; mantenho-me editando artigos jornalísticos, não existe nada mais interessante. Nas horas vagas, faço do papel meu confidente, do lápis, meu cúmplice. Sonho com um amor, um amor chamado Angélica.
Bom, vamos ao que interessa, pois sei que querem saber se ficarei ou não com a demoiselle, então, dir-lhes-ei agora o que fui capaz de bolar para surpreendê-la, ou, pelo menos, tentar fazê-lo. Como já disse, por enquanto, sem ter nenhuma confiança da moça, não teria coragem de encontrá-la, então resolvi agir enigmaticamente. Comecei mandando a ela um livro de sonetos de Shakespeare, algo romântico, disseram-me que as mulheres, em geral, adoram homens românticos, apostei na maioria. Junto ao livro, um cartão escrito: “Daquele que sonha contigo... Um beijo!”. Esperei uma semana para mandar algo mais, não queria parecer maçante. Após esse prazo, enviei-lhe um buquê de rosas, em anexo, um cartão com a frase: “Para combinar com a cor de seus lábios os quais almejo tanto!”. É impossível não ter surgido algum tipo de efeito sobre ela, no mínimo curiosidade; seria um avanço. Como eu mandava um entregador particular fazer o serviço, ela não tinha acesso ao meu endereço, deveria estar instigada para saber o remetente, era essa a intenção.
Mais sete dias se passaram, e eu, com certeza, estava mais instigado do que ela. Não sabia qual seria o próximo passo e, levado pela loucura do amor, enviei-lhe O sofrimento do jovem Wherter, de Goethe. Foi a pior coisa que fiz em toda a minha vida, independente da grandeza da obra, ela saberia que sofro por ela, e quando isso acontecesse, é certo que perderia um ponto, pura ingenuidade e inexperiência de relacionamentos, uma vez que só tive uma namorada, a qual me abandonou por eu ser taciturno e aparentemente mandrião.
Resolvi dar um passo certo e em frente, enderecei-lhe uma caixa de bombons suíços, uma maravilha de chocolate, doces os quais fiz questão de provar para averiguar a qualidade. Sendo ela cliente da doçaria, seria impossível que não apreciasse o meu presente. Junto à caixa, um novo cartão: “Nenhum desses é tão doce quanto você”. Agora sim! Estou esperançoso.
Para fechar com chave de ouro, fui obrigado a apelar ao grandessíssimo Camões, uma vez que meus sonetos nunca tiveram grande valia artística; mandei-lhe o mais conhecido entre os conhecidos:
Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente;
É um contentamento descontente;
É dor que desatina sem doer;

É um não querer mais que bem querer;
É solitário andar por entre a gente;
É nunca contentar-se de contente;
É cuidar que se ganha em se perder;

É querer estar preso por vontade;
É servir a quem vence, o vencedor;
É ter com quem nos mata lealdade.

Mas como causar pode seu favor
Nos corações humanos amizade,
Se tão contrário a si é o mesmo Amor?

Reescrevi o soneto do mestre aqui para que todos entendam o que sinto, pois alguém pode não conhecer a maravilha de tal obra. Queria tocar-lhe o coração, como ela tocou o meu. Passei dias pensando, analisando, refletindo etc. Precisava agir de modo mais concreto, pois não sabia se ela já gostava de alguém, se ela recebia e ou guardava meus presentes ou se os jogava fora, deu-me medo, uma fagulha de receio que eu já possuía cresceu e inundou meu peito. Confuso deveras. Uma coisa me acalmava um instante, ela não era compromissada, Emanuel deixou vazar a informação.
No dia seguinte, tomei um banho bem cedo e estava determinado a fazer alguma coisa naquele mesmo dia, algo sério e eficaz, queria encontrá-la.
Passei para o papel o endereço do lugar o qual gostaria que ela comparecesse para conhecer-me, juntamente com a data. Gelou-me todo o sangue só de pensar que a veria frente a frente, ferveu-me o mesmo líquido rubro só de pensar em tê-la pela eternidade de um segundo. Bilhete escrito, mandei que o entregasse no mesmo instante, não poderia pensar duas vezes senão desistiria, conheço-me bem. A partir daquele momento, já deveis saber o que se passou comigo: dores de barriga provenientes da ansiedade, inquietação e falta de confiança que são bem típicas de pessoas como eu. O momento de minha vida seria dali a dois dias, um sábado, num restaurante bem freqüentado no centro da cidade, e até lá eu já passara muito mal, muito mesmo, acreditem.
Preparei-me para o encontro. Cortei o cabelo, fiz a barba, perfumei-me, decorei um poema romântico, coloquei uma moeda a mais no bolso, queria impressionar qual fosse o modo. Quis ir mais cedo ao restaurante de modo a observá-la no local prometido, eu do lado de fora, é claro, segundos imortais. E ela estava lá, nem pude acreditar, seria um sonho realizado. Mas, em cima da mesa, estava um pacote, um pacote e uma flor da mesma cor daquela que eu havia lhe dado, juro que empalideci, já descobrira tudo, dentro do pacote estaria tudo que eu havia lhe dado e ela me devolveria tudo, até mesmo a flor representando o buquê. Pensei em voltar embora. Tudo bem, confesso: cheguei a voltar alguns passos, mas decidi que eu seria homem pelo menos uma vez na vida e retornei cheio de confiança e vitalidade, mesmo que fosse para levar um grande fora.
Enfim, entrei no bendito restaurante. Ela estava sentada de costas para a porta a qual eu entrei, cheguei um bocado mais perto e já senti o seu perfume; ah, que perfume! Que odor! Que cheiro sublime! Era a mistura de aromas florais mais perfeita que já havia percebido, indescritível. Voltei-me, fui ao balcão e pedi uma dose de uísque puro, sem gelo, para encorajar-me, bebi-a num gole e então resolvi: chegou a hora!
Marchei até a mesa todo confiante, passei ao seu lado, olhei seu rosto mimoso e perguntei se seu nome era Angélica, ela me disse que sim, então perguntei se podia me sentar, ela afirmou com um gesto de cabeça e um pequeno sorriso maroto, certa de que era eu o seu admirador. Sentei-me de frente a minha deusa, e quando o fiz, toda minha tensão desapareceu, a taquicardia cessou, foi como se a cadeira tivesse estabilizado minhas energias de modo a sugá-las terra abaixo. Então, novo em folha, apresentei-me pelo nome e como sendo o remetente dos presentes e dos cartões, ela sorriu, mas não como da primeira vez, sorriu toda solta, faceira, como uma criança quando ganha um brinquedo. Esperei, vergonhoso, seu lindo sorriso findar, ao término do mesmo, ela começou a perguntar-me o porquê de cada objeto enviado, mostrando-os um a um, pela ordem, os sonetos shekeasperianos, depois as flores, em seguida o Goethe, posteriormente os bombons, e por último Camões. Eu tive que resumir tudo, corado como um rubi, dizendo-lhe apenas três palavras: “Eu te amo!”. Não sei como fui capaz de ser tão direto e, ao mesmo tempo, tão sincero como desta vez o fui. As palavras fluíram tão naturalmente de minha boca que eu não pensava no que dizia, simplesmente disse. Ela, nesse instante, com a face mais avermelhada do que a minha e com a boca entreaberta não disse palavra por um minuto a refletir sobre o meu dito. Então fui obrigado a contar-lhe toda a minha história para que ela entendesse tudo e não me tivesse por louco. Disse-lhe tudo, até que induzi o pobre do Emanuel a me ajudar com tal caso, ela parecia estar ouvindo um conto de fadas, seus olhos brilhavam como constelação em céu limpo. Quando terminei a epopéia, ia pedir-lhe desculpas se a incomodei por algum momento, pois, querendo ou não, fui inconveniente; ela, com os lábios cintilantes e úmidos, deu-me um beijo, acreditem se quiser; um beijo com sabor de vinho, pois havíamos bebido uma taça do Porto, mas ao mesmo tempo, sua boca exalava um odor agradabilíssimo de mel, para mim, pura ambrosia. Depois que as bocas se tocaram, descemos os rostos ao pescoço um do outro, sem nos olhar, ambos envergonhados, foi algo tão sincronizado e automático, todavia tão sublime e sincero que cheiramo-nos o pescoço um do outro ao mesmo tempo, a pele eriçou-se a mim e a ela, o sangue pulsava latente em mim e nela, adrenalina virgem em minhas veias, algo nunca sentido antes, o coração palpitava descompassadamente. Depois de ter experimentado uma meia dúzia de sensações novas, ergui o rosto e fitei seu par de safiras raras, que também me fitaram, fazendo-me envergonhar. Ela sorriu angelicalmente e me disse “Eu te amo!”. Eu sou capaz de jurar-lhes que enterneci dos pés à cabeça, foi uma felicidade tamanha que fiquei sem letras na boca, só o que fiz foi beijar-lhe novamente e deixar escorrer uma lágrima no rosto, uma lágrima de ternura, de paixão, de castidade. O meu sonho de uma vida inteira tornado realidade, agora sim, vivia em pleno éden, com direito a uma acompanhante divina ao meu lado.
Paguei a conta e fomos embora abraçados, eu embalado por sua voz aprazível e ela confessando-me que nunca recebera poemas, flores ou doces de presente de alguém, que sempre foi tratada como objeto e taxada como aproveitadora, achara-me muito romântico e agradável, além de cavalheiro e inteligente, foi a primeira pessoa na face da terra que me disse isso.
Eu morava sozinho, então a convidei para me acompanhar a minha casa, ela hesitou um instante, mas acabou aceitando, pois parecia que gostara de mim também. Eu tinha um sofá muito aconchegante, uma das poucas coisas boas que consegui comprar com a remuneração a qual eu tinha; era um sofá de couro e em formato de “L”. Sentamo-nos à vontade e abrimos mais uma garrafa de vinho, este Bordeaux, que eu havia guardado para uma ocasião que eu não nunca tivera esperanças que chegaria. Coloquei uma música romântica de fundo e ficamos a conversar e a namorar durante uma boa parte da noite, e que noite! Uma noite estrelada com uma lua cheia magnífica. Li dois de meus poemas para ela e ela me disse que eram muito bons. Embriagados de paixão, dormimos um no colo do outro, uma cena esplêndida. Quando acordei, ela não estava mais em meus braços como outrora. Pensei que ela tivesse saído para comprar um jornal, pães etc., mas ela não voltou. Fiquei um tanto quanto apreensivo, mas acabei entendendo que ela se sentira envergonhada com a situação e fora embora.
Como eu tinha muito trabalho acumulado da semana anterior na qual fiquei escrevendo em cartões e comprando presentes, não pude ir procurá-la durante os dias úteis, então o fiz no sábado, uma semana depois da noite mais perfeita de minha vida. Fui até a sua casa e uma vizinha, ao ver-me, chamou-me e perguntou-me o nome, eu lho disse e ela entregou-me, com lágrimas nos olhos, um bilhete, um bilhete de Angélica. O bilhete dizia exatamente assim: “Oh meu amor, homem que me fez mulher por um dia, sinto muito ter que te deixar assim, mas não tive escolha. Fui traída pelo destino e só o que me restava era ti, esse ser humano sensível e meigo, alguém que pudesse me fazer sentir algo que eu nunca sentira antes. Perdoe-me, quero que saibas que realmente te amei, mesmo que por uma noite. Preciso te dar um conselho: aproveite a tua vida todos os instantes possíveis, pois não se sabe quando uma maldita doença, que te corrói aos poucos e prevê o pior, a qual eu me recuso a dizer o nome, vai te prender em suas teias e te sentenciar ao fim dos fins, à morte prematura. Fui covarde em fazer isso contigo, príncipe solitário, mas se não o fizesse, sê-lo-ia comigo. Contudo, saibas que fizeste uma mulher eternamente feliz, e que agora estando onde estou, posso dizer que me fui com o amor aflorado em meu coração. Agora, deixo-te deveras, fique com um beijo meu e o meu perfume para que não esqueças de mim! Está tudo nesta carta, amo-te! Angélica.”.
Jurei a mim mesmo não chorar por uma mulher enquanto habitasse esse mundo, mas nesse momento choro porque minha alma não está mais aqui, encontra-se com ela ad infinitum. Há coisas na vida as quais custamos a aceitar, essa é uma coisa a qual não aceitarei nunca. Meu anjo se foi, levou meu coração consigo; eu fico aqui, sem cor, esmaecido pelo vento da injustiça, a rogar a Deus um caminho para seguir. Ao menos sei que fiz algo de bom para alguém, e realizei meu sonho por um dia; que pena, apenas por um dia.

OBS: Conto que conquistou o 3º lugar no concurso nacional de contos e poesias da Fafiman, em novembro de 2008. Publicado pela CBJE na Seleta de Contos de Autores Contemporâneos, edição especial 2008.
quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Carma


Marco Hruschka


Preciso de unção pacificadora d’alma,

Possuo fantasmas que me roubam a calma.

A vela derretida queima-me o cutâneo,

Vivo nas profundas entranhas do subterrâneo

Buscando enterrar-me mais, na força da palma.

 

O belo feminino sempre a me atormentar...

Visões, miragens que obnubilam o meu olhar.

Preciso sair da masmorra do castelo,

Que me surja em sonho um Velho do Restelo

Para que, sabiamente, me venha aconselhar.

 

Escuridão, desesperança, súplica e Dor!

Qual sentimento esse denominado Amor!

Qual existência vale sem nele crer?

Serei orvalho evaporando ao amanhecer...

Retorne logo, ó Noite, por favor!


OBS: Poema publicado em outubro de 2008 no livro "Antologia brasileira de poetas contemporâneos, vol. 49".

Cheiro de lágrima


Marco Hruschka


Sou a própria poesia melancólica

A tinta que a pena expulsa

O pastor na paisagem bucólica

O vinho na cabeça convulsa

 

Os versos declamados pela voz embriagada

A chuva dissimulada pelo vento

O adeus da mulher amada

O que não tem nome, do amor o tormento

 

Exalo poesia cor de solidão

Sou ainda o efêmero sentimento

Aquele que dura a eternidade da paixão

Da rosa murcha sou ungüento

 

O prisioneiro escravizado

O que está sem existir

O reflexo do passado

A alma a se extinguir

 

Esvaio-me na aurora tropical

Não sinto ter que ir embora

Já fui alguém... Hoje um anjo celestial

Fica-me a saudade de outrora...

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Maringá, Paraná, Brazil
Marco Hruschka é natural de Ivaiporã-PR, nascido em 26 de agosto de 1986. Morou toda a sua vida no norte do Paraná: passou a infância em Londrina e desde os 13 anos mora em Maringá. Sempre se interessou em escrever redações na época de colégio, mas descobriu que poderia ser escritor apenas com 21 anos. Influenciado por professores na faculdade – cursou Letras na Universidade Estadual de Maringá – começou escrevendo sonetos decassílabos heroicos, depois versos livres, contos, pensamentos e atualmente dedica-se a um novo projeto: contos eróticos. Seu primeiro poema publicado em livro (Antologia de poetas brasileiros contemporâneos – vol. 49) foi em 2008 e se chama “Carma”. De lá para cá já, entre poemas e contos, já publicou mais de 50, não apenas pela CBJE, mas também em outras antologias. Em 2010 publicou seu primeiro livro solo: “Tentação” (poemas – Editora Scortecci). Em 2014, publicou “No que você está pensando?” (Multifoco Editora), livro de pensamentos e reflexões escrito primordialmente no facebook. É professor de língua francesa e pesquisador literário.

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"A vida é um compromisso inadiável" M. H.
"A cumplicidade é um roçar de pés sob os lençóis da paixão." M.H.

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